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O mês de Março foi o mês mais “verde” de sempre da história de Portugal. A energia produzida por fontes renováveis excedeu as necessidades energéticas do país em 3%, batendo o recorde alcançado em 2014, quando a participação das renováveis tinha atingido uma quota de 99% do mix energético. Isto significa que toda a energia consumida nas nossas casas teve origem em fontes de energia renovável, o que, não sendo totalmente verdade, permite afirmá-lo orgulhosamente.
À medida que estes episódios e conquistas começam a ser mais frequentes, os consumidores e as empresas começam também a olhar para sua eletricidade de forma diferente e começam a exigir que a sua energia seja fornecida apenas por eletricidade de origem 100% renovável. Dadas estas exigências, considero importante explicar alguns conceitos-chave acerca do sistema de fornecimento de energia e da forma como é comprovada a origem da energia consumida.
Desmistificando o percurso da energia
Fisicamente, a rede de energia é um simples sistema onde a eletricidade é gerada por uma fonte energética e é transportada através da rede para o ponto mais próximo onde esta está a ser necessária. O tipo de fonte energética pode ser de origem renovável, como por exemplo o sol ou o vento, ou de origem fóssil, tais como o carvão e o gás natural. Apesar de não existir em Portugal, a energia pode ser ainda criada através da fissão nuclear.
O mix energético português tem vindo a evoluir em direção a um futuro mais limpo, apostando em novas instalações movidas a energia livre de emissões.
![Figura 2 - Evolução da Capacidade Instalada em Portugal. APREN](https://dev.magnuscmd.com/wp-content/uploads/2018/05/imagen2JS-1024x394.png)
Figura 2 – Evolução da Capacidade Instalada em Portugal. APREN
Portanto, como é que sabemos que a energia usada para acender a televisão em casa vem realmente de fontes renováveis tal como nos garantiu o fornecedor de energia?
As Garantias de Origem
As Garantias de Origem (GO ou GdO) são certificados criados pela Comissão Europeia com o objetivo de informar o consumidor final acerca da percentagem de eletricidade que pertence a cada fonte de energia, conforme o seu atual fornecedor (mais info aqui).
A 15 de Fevereiro foi publicado em Portugal o Decreto-Lei nº29/2006 que obrigava os fornecedores de energia a informar os seus consumidores acerca do mix energético. Em 2008, o DL 51/2008 forçou os fornecedores a apresentar essa informação acerca do mix energético em todas as suas faturas. A legislação foi alvo de nova revisão em 2012 com o DL 215-A/2012, publicado pelo Ministério da Economia e do Emprego, sendo posteriormente completada pelo Regulamento das Relações Comerciais.
O mecanismo das GdO funciona como uma etiqueta de um determinado volume produzido por uma fonte de energia renovável, etiqueta que pode ser transacionada. Quando uma entidade (fornecedor ou companhia) compra essa Garantia de Origem, a mesa é cancelada no “electronic certificate registry”. Ao seguir este procedimento, o mecanismo assegura que esse volume de energia não seja contabilizado duas vezes e consegue fazer o seguimento ao “dono” final dessa energia.
Em Portugal, os certificados são usados para certificar:
- Energia produzida através de fontes renováveis (RES-GO)
- Energia para aquecimento/arrefecimento produzida através de fontes renováveis
- Energia produzida em centrais de cogeração muito eficientes
Como funciona em Portugal?
Bem, a resposta é: NÃO FUNCIONA!
As Garantias de Origem para energia produzida através de fontes renováveis foram inicialmente introduzidas em Portugal pelo DL 141/2010 publicado a 31 de Dezembro adaptando a Diretiva 2009/28 da Comissão Europeia, com o objetivo de informar o consumidor acerca da origem da sua eletricidade. É importante destacar que, segundo a legislação em vigor, toda a energia renovável abrangida por programas subsidiados (tarifa bonificada e outros) não pode entrar no mecanismo de Garantias de Origem, quantidade que é praticamente a totalidade da capacidade instalada em Portugal. O organismo responsável pela emissão e gestão deste mecanismo foi originalmente o LNEG (Laboratório Nacional de Energia e Geologia), sendo substituído pela REN (Entidade responsável pelo transporte de energia em Portugal) em 2013. Dois anos mais tarde, o mecanismo de GdO passou a ser responsabilidade da DGEG, através do DL 68-A/2015, organismo que detém a esta responsabilidade até aos dias de hoje, tendo, no entanto, a possibilidade de delegar a gestão da Emissão de Garantias de Origem a uma outra entidade.
Apesar das várias trocas das entidades emissoras desde 2010, nenhum certificado de Garantias de Origem de fontes renováveis foi emitido em Portugal até hoje.
Como podem os fornecedores garantir que a sua energia é verde?
Para responder a esta questão, devemos focar-nos em dois pontos:
- Até 2017, toda a energia renovável em Portugal era proveniente de centrais subsidiadas por programas como os de tarifa bonificada fazendo com que, segundo a legislação em vigor, ficassem excluídas do sistema de GdO. O valor equivalente de GdOs da produção destas centrais é transferido diretamente para a DGEG que pode ou não vender essas garantias para reduzir o deficit tarifário. Se sim, a DGEG tem a responsabilidade de informar o consumidor acerca da sua decisão.
- O mix energético de cada fornecedor é calculado tendo em conta a energia produzida abrangida pelo regime da tarifa bonificada, a energia comprada em mercado grossista (OMIE), contratos bilaterais em Portugal ou com Espanha e ainda energia abrangida pelo mecanismo de GdO.
Impacto no mercado
As comercializadoras têm sido forçadas a reinventar os seus produtos e serviços de forma a responder às necessidades dos seus clientes. Empresas e consumidores finais estão cada vez mais preocupados em consumir eletricidade de origem 100% renovável por várias razões: reduzir as pegadas de carbono das empresas, marketing, consciência, etc.
Mas de facto, os fornecedores não conseguem garantir, “legalmente” falando, que a energia fornecida aos seus clientes seja de origem renovável, ou, no limite, de origem renovável Portuguesa. Alguns fornecedores que tenham centrais de produção em Espanha podem assegurar com certificados de GdO de Espanha que colocaram na fronteira o valor estipulado de energia de fonte renovável, mas, infelizmente, a DGEG não reconhece esses certificados. Existem ainda comercializadoras que fornecem os seus clientes em outros países somente com energia renovável através da compra de GdO e ainda outros fornecedores que compram certificados de GOs em mercados internacionais para atribui-los à energia fornecida a certos clientes mas, uma vez mais esses certificados perdem força legal uma vez que a DGEG não os reconhece.
As comercializadoras têm lutado e contestado ativamente junto do governo e da DGEG apelando à urgência de ativar este mecanismo. Segundo consta, o Governo anunciou no passado mês de Abril que o sistema de
Garantias de Origem será iniciado em Portugal em 2019.
É absurdo dizer que Portugal consegue abastecer-se utilizando apenas energia renovável, mas os seus consumidores não podem afirmar que a sua energia é 100% livre de emissões.
Jorge Seabra | Energy Consultant
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