Como todos sabemos, a eficiência energética é central para as estratégias de transição e descarbonização energética em todo o mundo. É por isso que a AIE lhe chama «the first fuel», uma vez que oferece o recurso mais barato, mais rápido e mais limpo para a transição para uma energia verde, ao mesmo tempo que aborda as ameaças iminentes e de maior importância colocadas pelas alterações climáticas.

Só para se ter uma ideia, particularmente no curto prazo, as possíveis melhorias de eficiência provinientes do lado da procura representam quase metade da oportunidade de redução das emissões de gases com efeito de estufa, de modo a cumprir os objectivos do Acordo de Paris e limitar o aumento da temperatura global na Terra, neste século, a 1,5°C ou o mais abaixo possível dos 2°C.

Mas apesar do enorme potencial da eficiência energética, o mundo ainda está a ter dificuldades em captar todos os seus benefícios. A procura global de energia continua a aumentar, e as emissões de CO2 estão a níveis recorde. Embora os preços dos dos direitos de emissão e a eliminação dos subsídios aos combustíveis fósseis sejam importantes para criar um quadro mais equitativo para a eficiência energética, estes ainda estão longe de ser suficientes para conduzir o mundo na direcção certa.

Face a estas tendências preocupantes, há um reconhecimento crescente por parte dos governos e líderes em todo o mundo de que precisam de ser intensificados os esforços em prol de uma maior eficiência.

O Clube dos 3%

De acordo com uma análise da AIE, a mesma afirma que sob correctas políticas de eficiência, investimentos rentáveis e utilizando as tecnologias existentes, uma melhoria de 3% na intensificação energética é suficiente para assegurar a redução de uma parte significativa de emissões de gases com efeito de estufa necessários para cumprir os objectivos do Acordo de Paris.

Infelizmente, ao passo que o PIB e a disponibilidade total de energia primária cresceram exponencialmente, a taxa de intensificação energética (a quantidade de energia necessária para produzir uma unidade do PIB) tem diminuído consecutivamente nos
últimos três anos, deixando-a bem abaixo dos 3% que a AIE mostra serem centrais.

Image 1 – Global energy productivity bonus, actual and if energy efficiency had improved 3% Source: IEA

A título de curiosidade, se o mundo tivesse atingido estes 3% de melhoria durante esse período, mesmo utilizando a mesma quantidade de energia, podia ter conseguido aumentar o seu rendimento económico em mais 2,6 triliões de USD – aproximadamente a dimensão de toda a economia francesa.

Como tal, o tempo escasseia, e à medida que aumenta a pressão para uma acção climática mais forte, uma nova aliança de países, empresas e organizações internacionais decidiu juntar-se no ano passado e responder ao apelo da AIE formando um clube. Comprometeram-se em reforçar a sua ambição climática e utilizar o melhor possível as ferramentas à sua disposição com o intuito de tornar possível a melhoria anual da eficiência energética a nível mundial em 3%.

Neste contexto, comprometeram-se em incorporar nos seus planos nacionais, acções e compromissos específicos de eficiência que sejam condizentes com a melhoria anual de 3%, e participar numa coligação que se apoiará mutuamente no desenvolvimento de políticas e na implementação de projectos, quer seja através de assistência técnica, financeira ou de cooperação nacional.

Intitulam-se como o Clube dos 3%.

Os 15 países que participam nesta aliança são a Argentina, Colômbia, Dinamarca, Estónia, Etiópia, Gana, Honduras, Hungria, Índia, Irlanda, Itália, Quénia, Portugal, Senegal, e Reino Unido. Mais recentemente, em Julho, o Canadá também aderiu ao clube.

Um elevado número de grandes empresas e organizações também fazem parte do clube – como é o caso da Danfoss, EDP, Johnson Controls, LeasePlan, Saint-Gobain, Signify, Thermo King, Trane, e da Global Green Growth.

E, claro, o clube conta com os conhecimentos e a perícia de muitas organizações internacionais, nomeadamente a IEA, a Sustainable Energy for All Energy Efficiency Accelerators and Hub, a United Nations Environment Programme, o European Bank for Reconstruction and Development, a Global Environment Facility, e a Energy Efficiency Global Alliance.

Numa tentativa de colmatar a falha na melhoria da eficiência energética dos últimos anos, o clube decidiu concentrar-se em imlementar a tecnologia e as soluções de eficiência energéticas já disponiveis, na indústria, nos edifícios, nos transportes, nos equipamentos, na iluminação, e no abastecimento público de energia.

Relativamente não só a Portugal, mas também aos restantes países europeus deste clube, esta iniciativa pode ser vista em conjunto com o Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC 2030) e com a Directiva de Eficiência Energética (Diretiva 2018/2002), uma vez que, graças a toda a perícia de que dispõe o clube, é possível receber apoio e orientação adicionais, visando melhor alcançar os objectivos de transição climática da UE.

Em Portugal, por exemplo, já existem iniciativas a ser implementadas:

Não esqueçamos no entanto que, embora a formação de um clube e a definição de uma direcção sejam já por si um bom passo, até que algo seja posto em prática, um objectivo continua apenas a ser um objectivo.

Eis alguns exemplos de acções levadas a cabo por alguns dos membros do clube:

  • A 2 de Setembro de 2020, o governo português lançou un novo programa de eficiência energética. O “Programa de Apoio Edifícios mais Sustentáveis” inclui um conjunto de incentivos para a promoção da eficiência energética dos edifícios e da sua descarbonização, tais como, o isolamento térmico, sistemas de ar condicionado e aquecimento, energia renovável, e sistemas de eficiência hídrica. A verba para este programa tem um volume total de 4,5 milhões de euros, dos quais 1,75 milhões de euros serão implementados em 2020 e os restantes 2,75 milhões de euros em 2021.
  • A 7 de Outubro de 2020, a EDP anunciou que irá coordenar um projeto de 4 anos na Ilha Terceira, nos Açores chamado “IANOS” e que tem em vista a criação de uma comunidade de energia para demonstrar, através de uma intervenção direta no terreno, o potencial de incremento das fontes renováveis em uso nos espaços insulares, ultrapassando os desafios de gestão de rede e ao mesmo tempo aumentando a eficiência energética. Este projecto envolve 34 parceiros europeus e conta ainda com um investimento comunitário de 7 milhões de euros financiados pelo Programa Horizonte 2020

Nesta nota, poderia o Clube estar melhor preparado para a recuperação?

Até ao final de 2019, as alterações climáticas eram consideradas o maior desafio da humanidade e parecia que as coisas tinham finalmente começado a acontecer em matéria de eficiência energética.

Agora, de repente, ficou claro que o covid-19 exigiu que os governos concentrassem praticamente todos os seus esforços e recursos na protecção da saúde e bem-estar dos seus cidadãos. Mas, ao mesmo tempo, confrontam-se com o impacto económico que terá a crise provocada por esta pandemia e em como poderão impulsionar as economias e criar emprego, uma vez que tudo esteja sob controlo.

Embora seja verdade que alguns governos possam sentir necessidade de proteger indústrias estabelecidas – muitas das quais intensivas em combustíveis fósseis – e, por isso, apelar a um suavizar das medidas ambientais, sob o pretexto de estimular a economia, não nos podemos esquecer que, embora o covid-19 possa ter travado as economias e possa também ter reduzido as emissões de gases de efeitos de estufa a nível global, os desafios estruturais a longo prazo das alterações climáticas persistem.

Nesse sentido, podemos dizer que um plano de recuperação bem concebido deve, por um lado, considerar medidas que ajudam a estabilizar a economia a curto prazo, como por exemplo, taxas de juro mais baixas, subsídios e empréstimos a PMEs; mas, por outro lado, deve também considerar investimentos em todos os campos da energia verde, nomeadamente a eficiência energética, que maximizarão a velocidade e a dimensão do impacto económico e ajudarão na criação de emprego, garantindo simultaneamente benefícios a longo prazo tanto para a economia como para a sociedade. Benefícios esses que são o o incentivo à transição para um energia verde em todo o mundo e, claro, a redução das emissões de gases com efeito de estufa. É, por isso, uma oportunidade benéfica para todos.

Image 2 – Multiple Climate Opportunities to Stimulate the Economy Source: BCG

Portanto, a resposta é: o clube certamente tem a melhor resposta. Os países que consideram uma recuperação verde, centrada na eficiência energética, como é o caso do Clube dos 3%, podem estar em vantagem quanto à resposta para recuperação, porque as peças estão todas lá! Não só conseguem responder ao desafio a longo prazo das alterações climáticas, como respondem às exigências a curto prazo do estímulo Covid-19.

Matilde Loureiro | Energy Consultant

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