Os preços do mercado SPOT dispararam em Janeiro, ultrapassando os 100 €/MWh, devido a uma série de fatores, tais como a falta de chuva, fracos períodos de vento e a crise nuclear em França. Curiosas foram a reações a este aumento por parte dois países da Península Ibérica, que partilham o mesmo mercado único de energia, o MIBEL.

Em Espanha, várias notícias foram publicadas contestando o impacto deste aumento nas faturas do consumidor doméstico e exigindo explicações por parte do governo, forçando o atual ministro da energia, Álvaro Nadal, a tentar esclarecer esta subida. Já em Portugal, Janeiro foi marcado pelo aumento de 1.2% que o consumidor final irá sentir na sua fatura de luz durante este ano devido à atualização do Sistema Tarifário, surgindo uma ou outra notícia relatando que o governo exigiu que a Entidade Reguladora do Setor Elétrico (ERSE) investigasse este aumento abrupto dos preços da eletricidade do mercado maiorista.

Portanto, por um lado temos os consumidores domésticos espanhóis preocupados em pagar mais 20% do que pagaram pela eletricidade do mês de Janeiro de 2016, e por outro, temos os portugueses com queixas por um aumento de 1.2% da sua fatura. Algo está definitivamente errado e a resposta parece residir num único ponto: A metodologia para determinar a tarifa aplicada ao consumidor final de cada país, abrangido pelo mercado regulado.

Espanha e o seu PVPC

A 1 de Abril de 2014 a tarifa regulada conhecida como “Tarifa de Último Recurso” (TUR) foi substituída pelo “Precio Voluntário para el Pequeño Consumidor” (PVPC), destinada aos consumidores domésticos fora do mercado livre e com uma potência instalada inferior a 10 Kw (12.5 kVA). O preço da energia desta nova tarifa passou a ser definido pelo mercado diário, chamado OMIE, expondo totalmente o consumidor final às subidas e descidas do preço do mercado marginalista de eletricidade.

1

Spot prices evolution in Spain. Source: M·Tech

Portugal e a sua TVCF

Com a transição para o Mercado Livre (ou Liberalizado), Portugal definiu o dia 31 de Dezembro de 2017 como data limite para que todos os consumidores de energia nacional passem a ser englobados por este mercado. Assim sendo, a partir de 2013, a tarifa para todos consumidores finais denominada de “Tarifa de Venda ao Cliente Final” (TVCF) passou a ter caráter transitório e a ser regulada totalmente pela ERSE, a entidade responsável pela regulação dos mercados energéticos em Portugal. Esta TVCF é revista anualmente e é uma tarifa aditiva, em que todos os conceitos são regulados e definidos no início de cada ano. O preço final da energia resulta então da soma das tarifas responsáveis pelo preço da energia, pelo transporte, distribuição, pelo uso global do sistema e ainda pelos custos de comercialização. Esta TVCF tem ainda uma natureza incremental, o que significa que aumenta todos os anos uma percentagem de forma a “encorajar” o consumidor a transitar para o mercado liberalizado voluntariamente, procurando melhores preços.

 

O impacto das duas metodologias

Uma vez que já se conhecem as diferenças entre as tarifas reguladas de cada país, torna-se mais fácil perceber a diferença das reações dos consumidores em cada território. Por um lado, mais de 1 milhão de consumidores domésticos é diretamente afetado pelas oscilações de mercado e, neste momento, está preocupado com o aumento de 20% da sua fatura de eletricidade no mês passado comparando em período homólogo, e ainda mais preocupado com a possibilidade de a situação se repetir durante o ano. Na outra extremidade temos os consumidores Portugueses que ainda estão abrangidos pelo mercado regulado (atualmente 1.42 milhões de 6 milhões) que pagam o mesmo €/MWh todos os meses, independentemente dos preços marcados no mercado diário, sendo a sua única preocupação o aumento de 1.2% do preço final da sua fatura mensal.

Comparando as faturas de Janeiro dos dois países durante os últimos 4 anos, confesso que esperava um resultado diferente do obtido.

2

Energy bill cost evolution for January for PVPC and TVCF. Source ERSE & Periodico Energía

O resultado apresentado na Figura 2 mostra outra razão que explica a inexistência de queixas e reclamações por parte dos Portugueses. Independentemente dos preços record registados no passado mês de Janeiro, especialmente comparando com os preços do mesmo mês em 2016 (menos 35€/MWh), a verdade é que a fatura de eletricidade de um consumidor português de último recurso seria na mesma mais cara em 2017, longe de qualquer influência do preço marginalista da eletricidade ou do crescimento da participação das energias renováveis no mix energético de Portugal, que deveria significar preços mais baixos.

É realmente interessante como os dois países que partilham o mesmo mercado de preços Spot e preços a Futuro, preços esses que normalmente até estão em paridade na maior parte dos dias, possam ter formas tão distintas de lidar com os consumidores finais não abrangidos pelo mercado livre. O método Espanhol permite uma maior transparência, já que os preços refletem realidade do mercado e obriga o consumidor a estar mais atento, informado e alerta sobre as alterações que possam acontecer. Não obstante, o método aplicado em Portugal não pode ser criticado, uma vez que este tem como objetivo extinguir o mercado regulado, em busca de uma maior igualdade de oportunidades e igualdade para todos os consumidores do país.

3

SPOT prices evolution – Portugal. Source: M·Tech

Com base na evolução dos preços Spot dos últimos três anos e a atual projeção de preços para 2017 (Figura 3), os consumidores Portugueses de último recurso têm vindo a pagar um preço muito acima do custo real da energia elétrica e, consta que, o período de extinção desta tarifa regulada, anteriormente planeada para o fim de 2017, será prolongada para finais de 2020.

Janeiro de 2017 foi sem dúvida um marco histórico do Mercado Ibérico de Eletricidade. O que aconteceu deveria ser analisado de forma detalhada e todos os consumidores deveriam de ser devidamente informados sobre o impacto dos preços do mercado diário. Quanto aos consumidores Espanhóis, o conhecimento das causas que levaram à subida dos preços poderia tranquilizá-los, quanto muito por perceberem que alguns motivos são infortúnios pontuais de clima desfavorável. Já os consumidores Portugueses deveriam prestar mais atenção a exigir mais informação sobre o que estão realmente a pagar pela sua eletricidade, acelerando assim a transição para um Mercado Único Peninsular.

Jorge Seabra | Energy Consultant

Si te ha parecido interesante ¡compártelo!

Artículos Recientes


¿Quieres saber más?